terça-feira, 1 de setembro de 2009

lei 12.016/09 comentada - artigo 7º

Art. 7º - Ao despachar a inicial, o juiz ordenará:
I - que se notifique o coator do conteúdo da petição inicial, enviando-lhe a segunda via apresentada com as cópias dos documentos, a fim de que, no prazo de 10 (dez) dias, preste as informações;
II - que se dê ciência do feito ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada, enviando-lhe cópia da inicial sem documentos, para que, querendo, ingresse no feito;
III - que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida, sendo facultado exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica.
§ 1o Da decisão do juiz de primeiro grau que conceder ou denegar a liminar caberá agravo de instrumento, observado o disposto na
Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil.
§ 2o Não será concedida medida liminar que tenha por objeto a compensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza.
§ 3o Os efeitos da medida liminar, salvo se revogada ou cassada, persistirão até a prolação da sentença.
§ 4o Deferida a medida liminar, o processo terá prioridade para julgamento.
§ 5o As vedações relacionadas com a concessão de liminares previstas neste artigo se estendem à tutela antecipada a que se referem os
arts. 273 e 461 da Lei no 5.869, de 11 janeiro de 1973 - Código de Processo Civil.

No art. 7º, a lei perdeu uma grande oportunidade de aclarar uma discussão que durou pelos quase 50 anos em que a Lei anterior permaneceu em vigor: afinal, qual é a posição da autoridade coatora no mandado de segurança? Ele é o réu, é assistente do réu, é uma figura anômala? O que mais ou menos se vinha entendendo é que o réu no mandado de segurança é a entidade que a autoridade coatora presenta (lembre-se de que a autoridade não representa o Estado, mas sim o presenta. Ao agir, ela é Estado. Para usar uma expressão popular, o Estado "baixa” na autoridade). A autoridade teria apenas uma legitimidade anômala para figurar no processo, apenas para prestar as informações. Realizado esse ato, ela não pode mais atuar no processo.
A leitura do art. 7º, combinada com o art. 14, § 2º, parece revelar que a lei mudou – e para pior – esse entendimento. Esse último dispositivo estende a autoridade coatora o direito de recorrer da sentença. Assim, o que parece agora é que há um litisconsórcio passivo entre a autoridade coatora e a entidade.
Esse entendimento, que parece ser o mais coerente com a leitura conjugada dos dispositivos, não serve para nada além de complicar a tramitação do MS. Dou apenas 1 exemplo: se a entidade pública resolve não recorrer, conformando-se com a decisão, e a autoridade coatora, por picardia, apela da sentença. Poderá o Estado cumprir a sentença ou deverá aguardar a solução? Eventual condenação em dinheiro ficará travada, uma vez que a expedição de precatório exige o trânsito em julgado da decisão (CF, art. 100). E se o Estado resolve cumprir e depois, por alguma razão, a decisão é reformada? Como fica?
Parece ruim, mas ainda fica pior: a lei não esclareceu se a autoridade coatora tem legitimidade apenas para apelar ou para todos os demais recursos? E nem se argumente que se a lei disse apenas apelação é só apelação, porque a apelação é o único recurso ao qual a lei expressamente regulamentou. A valer esse raciocínio, não cabem embargos declaratórios, Recurso Especial ou Extraordinário em MS, para ninguém, pois a lei não menciona.
Imagine: recurso extraordinário da autoridade coatora, para insistir que aquele ato que ela adotou é legítimo! Onde esse mundo vai parar...
Tem mais: a lei não esclareceu se a autoridade coatora tem que ser intimada para apresentar contra-razões a eventual recurso de apelação do impetrante. Sim, porque, logicamente, se pode recorrer, também poderia apresentar contra-razões.
Mais ainda: se a autoridade coatora pode recorrer, deveria ela ser intimada pessoalmente da sentença? Sim, porque como ela não tem advogado nos autos (o advogado é o ente público), não tem obrigação de ter ciência das publicações do processo.
E toda essa confusão para quê? Apenas para satisfazer o entendimento doutrinário de que a autoridade coatora tem interesse em defender o próprio ato, porque, em tese, muito em tese, pode ser responsabilizada pelo mesmo. Não seria melhor continuar deixando que ela se defendesse em eventual processo disciplinar, do que ficar enrolando a vida do pobre impetrante, que nada tem com isso.
Infelizmente, esse é o problema de ter leis feitas por pessoas que podem até ser bons teóricos, não tem nenhum senso prático, ausência que se alia ao desejo de positivar seus entendimentos pessoais.
O inciso III está sendo muito criticado pela OAB e por outras entidades, alegando que a possibilidade de exigência de caução para deferimento de liminares fere a garantia da inafastabilidade da jurisdição. Não é verdade. A influência do dispositivo não é mais que psicológica. Agora o juiz pode ver isso escrito na lei e se lembrar que, pelo poder geral de cautela, consagrado no CPC, ele sempre pode exigir caução para deferir qualquer medida de caráter provisório. Ficou tudo na mesma.
A previsão de agravo de instrumento, no § 1º, serve para afastar um entendimento jurisprudencial equivocadíssimo, que afirmava que, como o agravo não tinha previsão na lei de MS, ele não cabia. Isso sempre foi bobagem. Se fosse assim, também não caberiam embargos declaratórios, que também não tinham previsão, mas ninguém nunca negou que esse recurso coubesse.
O § 2º, também muito criticado, busca evitar liminares de caráter irreversível, ou de difícil reversão posterior. Se você libera a mercadoria importada, equipara o servidor (salário tem natureza alimentar, logo é irrepetível) ou autoriza a compensação tributária, adeus. A restituição depois, se cassada a liminar, é muito difícil. Tenho dúvida sobre a validade desse dispositivo, mas não me parece absurdo, do ponto de vista da razoabilidade.Os §§ 3º, 4º e 5º em nada alteram a sistemática atual, nada contendo que seja digno de nota.

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