sábado, 27 de dezembro de 2014

A crise na Rússia

Há quase duas décadas atrás (que vergonha), eu gostava muito de palestras voltadas para o público empresarial, por influência do meu pai, que é comerciante. Hoje me lembrei de uma que me parece aplicável aos concursos públicos. O professor Marins, uma vez, contou que ele estava se deslocando para ir a uma palestra em uma cidade do interior e parou em um bar para comer alguma coisa. Segundo ele, o bar era sujo, com teias de aranha nos cantos, e faltando cadeiras para os clientes. Quando ele se dirigiu ao balcão, nada do que ele queria estava disponível e, quando ele finalmente encontrou algo para comer, o resultado foi decepcionante: uma fritura encharcada e um café morno. Enquanto fazia o seu lanche, Maris contou que começou a conversar com o proprietário e, quando este soube da sua atuação no ramo empresarial, a primeira coisa que disse foi: "Professor, eu estou muito preocupado com essa crise na Rússia!". 

Moral da história: ao invés de se preocupar em limpar o bar, oferecer produtos melhores ou tomar quaisquer providências que tivessem impacto imediato no seu negócio, o sujeito estava preocupado com eventos para além do seu controle, cuja possibilidade de impacto na sua realidade, apesar de efetivamente existente, é irrisória. 

Nesses anos de blog, uma das coisas que eu mais vi foram pessoas preocupadas com a crise da Rússia. Alunos começando o curso de Direito preocupados com três anos de atividade jurídica, outros que nem prestaram o concurso e estão preocupados com a prova de títulos, pessoas preocupadas com os locais onde serão lotados caso passem num concurso do qual não passaram nem da primeira etapa. Até gente preocupada com remoção de cargo que não ocupa eu encontrei! 

Não me entendam mal, eu não tenho problema algum em receber essas mensagens ou responder essas perguntas. Quem me conhece sabe que comigo não tem assunto proibido! As perguntas, inclusive, me ajudam a enriquecer o conteúdo do blog. A minha preocupação é o que passa na cabeça de quem faz essas perguntas. Se você está querendo saber esse tipo de coisa por simples curiosidade, tudo bem. Mas se você realmente se preocupa com elas, você está indo pelo caminho errado. Se você ainda está na graduação, eu já disse mil vezes que sua única preocupação deve ser estudar e se esforçar para terminar o curso com uma boa base. Fazer uma boa faculdade, independentemente de você cursar uma faculdade boa. Se você está prestando um concurso, preocupe-se com as etapas na medida em que elas se apresentam. Não adianta ter títulos ou ser bom de prova aberta se você não passa da primeira etapa. Acreditem, conheço várias pessoas que seriam excelentes em provas abertas, porque escrevem muito bem, mas simplesmente não passam da prova objetiva. 

Finalmente, locais de lotação ou facilidade de remoção, embora sejam fatores relevantes - foram relevantes para mim, pelo menos -, não podem ser a única razão ou a razão determinante para que você escolha uma carreira. Tendo escolha, ainda me parece melhor passar 35 anos fazendo o que você gosta no pior lugar do mundo do que fazendo o que você abomina na cidade em que você nasceu, cresceu e passou a sua vida inteira. Uma coisa que os meus colegas que foram lotados em localidades que não os agradava me ensinaram é que todos somos resistentes a mudanças. Por outro lado, todos somos extremamente adaptáveis. Colegas meu foram lotados em municípios dos quais nunca tinham ouvido falar, ansiosíssimos com a possibilidade de remoção e, em pouco mais de dois anos, já tinham se casado e decidido estabelecer residência definitiva nesses lugares. Só no meu concurso deve haver pelo menos cinco procuradores(as) nessa situação. A vida muda e, se você tiver um mínimo de abertura para mudanças, eu tenho certeza de que estar na carreira certa é muito mais recompensador do que estar no lugar que você desejaria. 

Eu fiz questão de escrever isso porque eu mesmo, muitas vezes, estive preocupado com a crise na Rússia e hoje sei que isso é um equívoco. Organizar as suas prioridades e investir energia naquilo que está sob seu controle é muito mais proveitoso, tanto em termos de alcance de metas, quanto de tranquilidade mental, do que se preocupar com possibilidades remotas de problemas que você nem sabe se vai ter. 

sábado, 20 de dezembro de 2014

Estatísticas da Prova Objetiva do MPF: como os números podem ajudar você a ser Procurador da República 1

Contrariando as expectativas, o Conselho Superior do MPF optou por manter, para o 28º Concurso, a mesma banca que já dirigiu os 3 concursos anteriores. Isso me parece uma vantagem para os candidatos de agora. Pelo menos, temos um guia de como uma boa parte dos examinadores se comportou no passado. Contudo, pensando nisso, eu comecei a notar que muita gente não consegue, vamos dizer, tirar a mensagem das provas anteriores. É que, vistas com olhos de candidatos, as questões e as provas, muitas vezes, parecem muito diferentes.

Por essa razão, minha proposta aqui é fazer uma análise estatística dos examinadores que se repetiram nos últimos concursos, de modo que vocês possam, sem ter que perder tempo com isso, ter uma noção do que se pode extrair do comportamento de cada examinador. Ressalto, contudo, que quem ainda não refez as 3 provas anteriores, da forma como eu explico aqui no blog (relendo as questões e pesquisando as razões pelas quais errou: http://www.edilsonvitorelli.com/2011/06/o-que-fazer-depois-da-tempestade.html) acabou de perder o direito à ceia de natal. Você vai passar a noite do dia 24 fazendo isso, para aprender a deixar para a última hora...

Começo minhas estatísticas com Direito Constitucional e metodologia, examinado, nos últimos 3 concursos, pela Subprocuradora-Geral Deborah Duprat. Adotei o seguinte critério de análise: todas as assertivas que exigiam conhecimento novo, eu considerei uma questão separada. Assim, questões em que as 4 assertivas não tinham relação entre si, eu considerei como 4 questões diferentes, para fins estatísticos. Aí vem a primeira informação:

DICA 1 todas as questões elaboradas pela Deborah, nos três concursos anteriores, foram estruturadas superpondo conhecimentos de pontos distintos da matéria. Em nenhuma delas bastava você ter informação sobre um assunto e as alternativas eram variações sobre um conhecimento pontual. Isso significa que você vai, provavelmente, levar mais tempo para fazer a prova de Constitucional do que talvez pudesse imaginar quando considerou o número absoluto de questões.

Por outro lado, detectei algumas situações em que, se você tivesse conhecimento de um dos pontos envolvido na questão, poderia resolvê-la por eliminação, sem que soubesse os demais. Logo,  

DICA 2 - raciocínio por eliminação é especialmente importante na prova de direito constitucional.

Vejam essa questão do 27º Concurso:

9. ASSINALE A ALTERNATIVA INCORRETA:
a) ( ) o STF, em tema de violência doméstica contra a mulher, entende que, para o início da ação penal, outros valores constitucionais devem ser ponderados, especialmente a preservação da entidade familiar e o respeito à vontade da mulher;
b) ( ) a concepção deliberativa da democracia vê a política como um empreendimento cooperativo, em que tão importante quanto a decisão é o debate que a precede;
c) ( ) o republicanismo contemporâneo assenta- se principalmente nas seguintes ideias: liberdade como “não dominação”; direito à participação popular na vida pública; e igualdade, inclusive em sua dimensão material;
d) ( ) o tratamento constitucional da atualidade no que se refere à questão indígena tem como seu pressuposto central o pluralismo.

Você poderia não saber nada de índios, de pluralismo, de democracia deliberativa ou de republicanismo. Bastava saber que o STF decidiu que a ação penal, nos casos de Lei Maria da Penha, é pública incondicionada. E isso caiu até na prova da OAB, de tão divulgado que foi!

Com os pressupostos que elenquei, minha análise estatística concluiu o seguinte:

25º concurso

Teoria = 28 questões
Jurisprudência - = 10 questões
Lei = 0
Tratado Internacional = 2 questões

26º concurso

Teoria = 26 questões
Jurisprudência = 14 questões
Lei = 0 questões
Tratado Internacional = 0 questões

27º concurso

Teoria = 27 questões
Jurisprudência  = 13 questões
Lei = 0 questões

Obs: lembrando, novamente, que o número de questões foi definido em razão do conhecimento necessário para responder a uma questão, de modo que, na prova de constitucional, cada assertiva foi considerada uma questão diferente.

Analisando os dados que exponho acima, fica fácil chegar a uma primeira conclusão:

DICA 3 – pare de ler a Constituição.

Se você está perdendo seu tempo decorando as hipóteses de estado de sítio ou de estado de defesa, você está apostando em algo muito pouco provável de ocorrer. Nenhuma questão de Constitucional, em três concursos, era passível de ser resolvida apenas pela letra da Constituição ou de leis. Apenas no 25 Concurso, duas assertivas exigiam o conhecimento literal de um tratado internacional, das pessoas com deficiência. Um jurista português, que tivesse um profundo conhecimento de teoria do direito constitucional, teria um bom resultado na prova, sem nunca ter lido a Constituição do Brasil. Isso é impressionante. 
A análise das três provas conduziu-me à conclusão de que, embora a jurisprudência do STF seja importante para estudar para a prova do MPF, não é tanto quanto possa parecer, à primeira vista.

DICA 4 - O estudo da teoria constitucional é o mais importante para a prova de Constitucional do MPF.

Muitas questões, mesmo que constem expressamente “de acordo com o STF”, estão, em verdade, debatendo aspectos de forte cunho teórico. São conhecimentos, por exemplo, de controle de constitucionalidade, que, embora tenham se sedimentado na jurisprudência do STF, são tão debatidos em livros de direito constitucional, e é mais fácil apreendê-los a partir da teoria do que da jurisprudência. Eu considerei a minha análise de questões que dependiam de conhecimento jurisprudencial até mesmo generosa. Houve algumas questões limítrofes em que eu mesmo fiquei na dúvida se era mais fácil obter aquele conhecimento na jurisprudência ou na teoria e acabei classificando como jurisprudência. Mesmo assim, o resultado de minha análise demonstra que aproximadamente 2/3 da prova de direito constitucional e metodologia dependia de conhecimentos de teoria e 1/3, no máximo, de jurisprudência do STF, sendo que uma parte desse terço você provavelmente veria referido em livros teóricos.
Feita a análise quantitativa, passo a uma percepção qualitativa da prova. Todas elas tiveram questões de índios e minorias variadas, como mulheres, deficientes. É preciso estudar isso. As questões de jurisprudência do STF foram fortemente focadas em controle de constitucionalidade. Houve pouca coisa sobre posicionamentos constitucionais materiais do STF. Então,

DICA 5 - estude a jurisprudência do STF com mais foco em questões processuais e de controle de constitucionalidade, ao invés de entendimentos de direito material.  

Termino com uma analogia de cinema: quem viu o filme “Quebrando a banca” se lembra que em todo o filme, a ideia de contar cartas no 21 é baseada em possibilidades estatísticas. O que digo aqui não impede que a examinadora altere completamente seu estilo. Em concurso, tudo é possível. Mas, como eu sempre digo, é inviável estudar tudo, então me parece preferível aumentar as chances e estudar dentro das tendências anteriores.


Nos próximos dias, acompanhem as estatísticas dos outros examinadores.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

28º Concurso do MPF: Banca votada pelo CSMPF

Conforme chamou minha atenção o leitor Eduardo, na sessão do dia 2 de dezembro, o Conselho Superior do MPF debateu a questão da formação da banca do concurso. O áudio da sessão é público e está disponível em http://midia.pgr.mpf.gov.br/csmpf/audio/2014/ordi/10_ordi_CSMPF2_12_14.mp3. A banca não foi publicada, mas é altamente provável que ela esteja definida. Em síntese, considerando a falta de tempo hábil para aprovar a resolução de definição de critérios da banca, decidiu-se manter a composição dos concursos anteriores. Assim, surpreendentemente, não temos grandes mudanças na banca do concurso, de modo que, conforme eu já havia mencionado no post anterior, as provas anteriores, que eram um guia bom para o concurso, se tornaram um guia excelente. 

Portanto, ficamos assim: 
Direito Constitucional e metodologia: Deborah Duprat 
Direito Internacional Público e Privado e Proteção Internacional de Direitos Humanos: Denise Abade 
Direito Eleitoral: Eugênio Aragão 
Direito Administrativo e ambiental: Nicolao Dino 
Direito Tributário: José Arnaldo da Fonseca 
Direito Econômico e do Consumidor: Daniela Teixeira (OAB) 
Direito Civil e Processual Civil: Sandra Cureau 
Direito Penal: Ela Wiecko 
Direito Processual Penal: Douglas Fisher. 
Já escrevi sobre praticamente todos os examinadores em postagens sobre os concursos anteriores. Não há dúvidas de que todas as tendências anteriores permanecem. Quem ainda não refez as provas da primeira etapa, pelo menos, dos três concursos anteriores, deve refazê-las imediatamente, para pegar o jeito das questões. 

Vou destacar aqui, entre os examinadores, o “novato” Douglas Fisher. É claro, se trata de um examinador novo, então é difícil prever, mas há duas características do Douglas que eu acredito que possam auxiliar nos estudos. Primeiro, ele é muito ligado em jurisprudência. Quem conhece o CPP comentado, que ele escreveu juntamente com o Eugênio Pacelli, sabe disso. Eu aposto em uma prova de processo penal muito mais jurisprudencial e menos teórica que as anteriores. Por outro lado, Douglas é muito crítico da jurisprudência, principalmente dos excessos do garantismo. Deem uma olhada, por exemplo, neste link: http://bdjur.stj.jus.br/xmlui/bitstream/handle/2011/60553/garantismo_penal_integral.pdf?sequence=1. É claro que esses temas são mais propícios a questões de segunda etapa, mas é interessante saber que o examinador tem esse interesse. 


Assim, eu estudaria os temas atuais de processo penal na jurisprudência, sobretudo os relacionados com questões federais. Prometo, nos próximos dias, delimitar um pouco mais esses temas. Por hora, entretanto, quero deixar registrado que a banca, muito provavelmente, está definida e que o estudo deve ser fortemente focado nas provas anteriores.

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Update: Banca examinadora do MPF

Só para ter certeza de que estamos todos na mesma página, gostaria de fazer um rápido update sobre a banca do MPF. O update é apenas para dizer que não há nada de novo. Eu não tenho notícia oficial ou extraoficial de que a banca tenha sido definida. A única examinadora definida é a da OAB, que é a mesma do concurso passado. O palpite que alguém postou como uma verdade no correio web, mesmo que se confirme, é um palpite fácil. Ele repete todos os examinadores do concurso anterior, mantendo a Denise Abade no Direito Internacional e transferindo o Eugênio Aragão, que deixou essa cadeira no meio do concurso, para o Direito Eleitoral. Sendo ele o Procurador Geral Eleitoral, essa sugestão para acomodá-lo na banca, sem tirar a Denise, é mais que óbvia. O único palpite diferente é o Douglas Fischer como examinador de Processo Penal. Douglas é cotado para essa função há algum tempo, mas ele foi professor em cursos preparatórios e eu não sei se o período de desincompatibilização já transcorreu. 

Enfim, parem de se torturar com isso. Essa possibilidade é tão verdadeira quanto qualquer outra, uma vez que o CSMPF não deliberou sobre a banca. Como registrei no post passado, havia uma demanda do Conselho Superior de que os membros da banca fossem alternados no futuro e foi isso que causou o atraso na divulgação desta. Se fosse (ou se for) para compor uma banca quase idêntica à da prova passada, é pouco provável que o CSMPF tivesse se dado a esse trabalho. 

Sei que o momento é de muita tensão, mas procurem não se condicionar por essa espera. As provas dos três ou quatro concursos anteriores continuam sendo bons guias de estudo, mesmo que a banca venha a ser alterada. 

Absurdos jurídicos V

Essa dispensa qualquer comentário.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L13050.htm


terça-feira, 18 de novembro de 2014

Estudando para o MPF sem saber a banca

Já escrevi aqui, e quem está por dentro de concursos sabe, o perfil da banca em concursos do MP é muito importante, por uma simples razão: a prova usualmente se apoia menos na jurisprudência do que as provas da magistratura. Quem estuda para a prova do TRF4 há dez anos sabe que a prova muda, mas ela vai se manter girando em torno dos debates jurisprudenciais do tribunal. Quem estudava para o MPF há dez anos atrás, enfocava coisas muito diferentes das que um estudante de hoje dá importância. Por exemplo, no 23º concurso, uma das matérias inusitadamente mais difíceis foi direito civil! Direito Constitucional era uma matéria fácil, até a prova do 24º concurso, que entrou para a história dos concursos com inúmeras questões inesquecíveis. No 25º, direito internacional, uma matéria que nem caía no concurso, mudou o jeito como se pensa o concurso do MPF.
Entendido isso, fica esclarecido que o que se segue é uma estratégia baseada em fatos incompletos, portanto, deve ser vista com reservas. Mas o tempo está passando, então vamos lá. O que eu estudaria se estivesse a 3 meses da prova, sem saber a banca? Primeiro, você ter que se conscientizar de que a maioria dos bons candidatos é reprovada por não fazer a nota mínima em algum dos grupos, e não por não fazer o mínimo no geral. Então, o mais importante é verificar se há algum grupo que seria o seu calcanhar de aquiles. Eu tinha certeza de qual era o meu: penal e processo penal. Na época, eu só me salvei nesse grupo porque ele tinha o eleitoral. Hoje, com essas matérias sozinhas no grupo 4, se você não é bom nisso, aí está a sua prioridade. O foco: é muito difícil dizer, mas, nas provas anteriores, penal cobrou muita parte geral e alguns crimes mais específicos do MPF, como sistema financeiro, contrabando e descaminho, coisas que não são muito usuais para quem estuda para o MP estadual. Em processo penal, as provas anteriores estiveram focadas em questões, na minha opinião, um pouco mais abstratas. Eu não vi muitas minúcias de letra de código, como vi em processo civil.
Depois do grupo IV, eu acho que o mais perigoso é o II, por causa do direito internacional. É bem verdade que, quem já vem estudando para o MPF há algum tempo já está mais do que ciente do nível da prova, então, deve estar preparado para ela. Sobre esse assunto, eu tenho dois palpites: eu não acho que o Eugênio Aragão será o examinador, dado que ele está exercendo função eleitoral e não terminou o concurso passado. Para os candidatos, isso é uma boa notícia. A notícia não tão boa é que a Denise, que assumiu a posição do Eugênio apenas para a prova oral no concurso passado foi bastante rigorosa, inclusive reprovando candidatos. Então, eu não teria tanta certeza de que a saída do Eugênio vai facilitar a prova.
Depois do grupo II, curiosamente, o grupo que pegou muita gente na última prova foi o III. Muita gente teve dificuldade com o estilo de prova da Sandra, cobrando questões mais de lei e menos teóricas, sobretudo em processo civil. Se isso pode parecer bom, para quem acompanha a prova do MPF mais de longe, para o bom candidato, não é. Os estudantes mais específicos do MPF acabam se aprofundando muito nas matérias e têm dificuldades, muitas vezes, de resolver questões que, abstratamente, pareceriam exigir menos conhecimento. Eu não acredito que a Sandra continue, pelo menos não com as duas matérias.
Quanto ao grupo I, acredito que continuaremos a ter uma prova teórica, tanto em constitucional, quanto em proteção internacional dos direitos humanos, continue ou não a Deborah na banca.  Eu não acho que o MPF vai perguntar quais são as hipóteses do estado de sítio. O macete do grupo 1 é o eleitoral. Do mesmo jeito que ele salvava quando estava junto com o penal, continua salvando aqui. A prova não costuma ser difícil, geralmente muito letra de lei. Se você for bem, já fica muito perto do mínimo no grupo.
Por fim, lembrando as estatísticas: 4 erradas = -1 certa. Vamos ver quais são as estratégias adequadas: 1) responder tudo, sem deixar nada em branco. Você terá que ter 18 acertos e até 12 erros, ou seja, 60% do grupo; 2) Deixar 1 só em branco é fria. Você continua tendo que fazer 18 acertos, porque, se fizer apenas 17, continuará tendo 3 pontos subtraídos, e ficará só com 14. 3) Você pode deixar 2 em branco. Nesse caso, você poderá ser aprovado com apenas 17 acertos, porque irá errar 11 e, como não há desconto por fração, você terá apenas 2 de desconto, ficando com 15. Repare, entretanto, que você está dificultando ligeiramente as coisa para você, porque 17 é 60,7% de 28, que serão as questões que você efetivamente responderá. 4) Se você quiser tentar a sorte para ser aprovado com 16 acertos, você só pode ser punido em 1 ponto, o que significa, no máximo, 7 erros. Logo, você teria que deixar 7 questões em branco. O problema é que 16 corresponde a 69,55% de 23, então, você estará se exigindo acertar quase 70% das questões que você efetivamente responderá.
Desse modo, eu só vejo duas opções viáveis para um candidato na primeira etapa do MPF. Ou você responde tudo, para buscar 18 acertos, com um índice de 60%, ou você deixa exatamente 2 em branco no grupo (nem 1, nem 3, exatamente 2), buscando 17 acertos, o que parece ser uma vantagem, mas, na prática, eleva ligeiramente o seu resultado percentual, quando comparado apenas com as questões que você responderá (60,7%). Nenhuma outra estratégia é matematicamente interessante. (P.S.: curiosamente, eu nunca fiz esse cálculo para mim mesmo, quando eu era candidato!)
Por enquanto, é isso. Vamos torcer para que a banca seja definida logo, para que os estudos possam ser reorientados a partir dos examinadores. 

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

28º Concurso do MPF

Independente de para quem você torceu nessas eleições, que foram muito parecidas com um jogo de futebol, se você quer ser Procurador da República, elas te deram uma vantagem: o edital do concurso do MPF, que era para ter saído em abril ou maio, saiu só agora. Então, agradeça ao seu candidato pelos 6 meses extras de estudo que você teve. 

Se você estava na expectativa de passar o carnaval em Salvador, imagine que a publicação do regulamento equivale àquele grito de guerra do puxador de uma escola de samba: “agora é pra valer!” Console-se com o fato de que, se você revender agora seus ingressos, vai fazer um dinheiro para comprar mais livros. 

Quanto ao regulamento, pelo menos na leitura que fiz, nada mudou. Toda a tradição do MPF ficou como estava. O edital é gigantesco, cai praticamente toda a matéria jurídica possível e imaginável, exceto direito previdenciário, o que é um alívio para muitos. Até o meu ponto sadicamente favorito dos meus cursos para a prova oral continua lá, firme, forte e completamente inútil para a vida de um Procurador da República: 

Direito Civil, Ponto 13.
a. Dos registros públicos.
b. Do estabelecimento.
c. Dos direitos de vizinhança.

Ocorreu uma mudança pontual em relação aos títulos, restringindo os artigos que são aceitos. Mas é muito cedo para pensar nisso e ninguém deve estar preocupado em publicar nada agora, e sim em estudar. 

A banca do concurso, que é o que todo mundo quer saber, todavia, ainda não foi publicada. Apenas a examinadora da OAB constou do edital, que é a mesma do concurso anterior e, como eu já referi aqui, diversas vezes, foi uma examinadora tranquila, que atuou em direito econômico e direito do consumidor, elaborando questões mais voltadas para econômico. De modo geral, foi uma examinadora de quem os candidatos gostaram, em todas as etapas. Se nada mudar, ela não oferecerá grande dificuldade a um candidato bem preparado. 

Isso se deve ao fato de que, como a banca dos últimos concursos foi praticamente a mesma, houve uma deliberação, por ocasião da escolha da banca passada, de que se promoveria um rodízio para o próximo concurso. Na última reunião, no dia 4 de novembro, o Conselho Superior do MPF compôs uma comissão para elaborar uma proposta de resolução sobre o modo de escolha da banca. Embora todos tenham dito que isso vai ser resolvido rapidamente, eu confesso que fiquei em dúvida. Acompanhem: é uma comissão que vai propor uma resolução para ser aprovada pelo CSMPF, criando critérios para a escolha. Ao que parece, a comissão não vai indicar os nomes. Depois que os critérios estiverem decididos é que os nomes serão escolhidos, de acordo com eles. 

O CSMPF só tem mais uma sessão ordinária marcada para este ano, no dia 2 de dezembro. A expectativa interna é a de que o Edital, com o cronograma do concurso, as datas das provas e a definição da banca, saia antes do final do ano. Vamos esperar que todas essas complexidades se resolvam a tempo. 

Nenhum dos membros dessa comissão designada foi examinador dos concursos anteriores e não acredito que sejam do próximo. No momento, não há qualquer elemento concreto sobre o qual se possa especular quem serão os examinadores do concurso futuro.  Quem estiver dizendo que fulano ou cicrano será da banca está chutando. O CSMPF prometeu mudanças, mas não deu qualquer dica sobre qual rumo essas mudanças tomariam. Ele também não proibiu que qualquer examinador dos concursos anteriores seja indicado novamente. Há um vento de mudança, mas isso não significa que ela será total, nem que se possa saber para que lado ele está soprando. 

Podemos, entretanto, traçar algumas linhas mestras: 1) todos os Procuradores que são professores de cursinho estão impedidos. Isso elimina vários nomes excelentes, que muita gente gostaria de ver na banca; 2) Até onde eu sei, nunca um membro da carreira de 1º grau foi indicado como examinador. Então, os candidatos, se essa tradição for mantida, são os Subprocuradores-Gerais e os Procuradores Regionais. Observo, entretanto, que muitos TJs colocam juízes como examinadores, então, se o MPF colocasse um procurador de 1º Grau, não seria um caso isolado. Mas eu não acredito que isso virá a ocorrer. 

Por enquanto, meus amigos, é só isso. Não existe nada mais de novo, a não ser especulações. Como o edital não mudou, continue estudando e aguarde as novidades. 

Quanto ao cronograma, o parâmetro temporal está compatível com o dos concursos anteriores: 1 ano entre o edital e a posse, ou, nesse caso, 1 ano e 3 dias. No momento, o que interessa é a 1ª etapa: 3 meses e 17 dias de estudo. Enquanto não soubermos os nomes da banca, será impossível ter mais elementos para dividir esse tempo com exatidão. Mas farei um esforço e publicarei, ainda neste final de semana, uma sugestão para tentar auxiliá-los. Aguardem!

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

A bíblia dos três anos de atividade jurídica: texto atualizado em outubro/2014

Não paro de receber dúvidas por e-mail sobre a questão dos três anos de atividade jurídica. Acho que virei algum tipo de guru online (lembram do Walter Mercado, ligue djá!) sobre esse assunto. Então vou tentar fazer um post definitivo, que sane todas as 71 dúvidas selecionadas que recebi (são mais de 71 no total). Para começar, precisamos estabelecer algumas premissas:

Primeira premissa: tudo o que eu disser que vale ou não vale não significa que você está condenado a ser reprovado. Significa que há chance de questionamento e, se possível, você deve fazer algo para evitar isso. A palavra de ordem aqui é risco. O risco pode ser maior ou menor. Se não tiver jeito, paciência. Toque a vida e, caso seja recusado, questione judicialmente. Muitas pessoas conseguiram e a jurisprudência tem sido razoavelmente condescendente com os candidatos em situações limite. 
Apesar disso não ser ciência exata, o pessoal exagera. Encontrei um artigo de fevereiro de 2013 no COJUR sobre o tema, no qual o autor se utiliza da Resolução 11/06 do CNJ, a qual o próprio CNJ considera revogada desde 2009 (http://www.cnj.jus.br/atos-administrativos/atos-da-presidencia/resolucoespresidencia/12126-resolu-no-11-de-31-de-janeiro-de-2006). 

Segunda premissa: os critérios utilizados pelos concursos variam muito. Alguns são mais rigorosos, outros mais brandos. O TJSP, por exemplo, aceita quase tudo. O MPF costuma ser mais resistente. É preciso ter consciência de que duas pessoas em situação idêntica podem ter resultados diferentes em concursos diferentes.

Terceira premissa: se você não tem três anos de colação de grau do curso de Direito, então você não tem três anos de efetivo exercício. Ponto final. Em hipótese alguma. Esse requisito é inafastável. Tudo o que for comprovado tem que ser após a colação de grau. Além disso, não adianta fazer mestrado, doutorado, advogar e ser conciliador judicial, tudo ao mesmo tempo e achar que pode completar três anos em um. Os três anos se completam na data do aniversário de sua colação de grau. Então, se colou em 31/05/2010, completará 3 anos em 31/05/2013 e não, por exemplo, em 31/12/2012, como pensam algumas pessoas (ano 2010, ano 2011, ano 2012).

Uma leitora informa que uma determinada escola da magistratura estaria oferecendo um curso preparatório que incluiria 192 horas de prática de conciliação, e informando que isso seria suficiente para obter os três anos de prática jurídica em apenas um ano. Essa informação é falsa. Não acreditem nesse tipo de promessa.

Estabelecidas essas premissas, vamos aos casos. 

A resolução que regulamenta os três anos para concursos da magistratura é a 75 doCNJ. No Ministério Público, é a Resolução 40/09, do CNMP. A leitura das resoluções é muito informativa e recomendada para quem tem dúvidas.

Advocacia: segundo o CNJ, é preciso praticar “5 (cinco) atos privativos de advogado (Lei nº 8.906, 4 de julho de 1994, art. 1º) em causas ou questões distintas”. Ou seja, é preciso tocar 5 processos, fazendo neles alguma petição relevante (apensos que tenham número diferente, como é o caso de impugnação ao valor da causa, são processos diferentes). Existe dúvida sobre a elaboração de dois atos relevantes diferentes no mesmo processo. Pela literalidade da resolução, isso seria um processo só, então contaria só uma vez. Quanto mais você se aproximar dos termos da resolução, menor o seu risco. 

Acredito também que processos do juizado especial podem ser contados, mesmo em causas cuja atuação do advogado não seja obrigatória (menos de 20 salários). Nunca vi alguém ter problemas em razão disso. Não há necessidade de que o efetivo exercício ocorra em anos consecutivos, ou mesmo nos últimos três anos.

Um problema é quem trabalha em escritórios e não assina as petições que faz. O ideal seria negociar com o chefe para assinar pelo menos as 5 anuais. Se isso não for possível, dá para tentar apresentar um contrato de trabalho, a carteira assinada como advogado ou as cópias dos holerites de pagamento, mas aí a coisa se complica muito. Também acho possível apresentar, a título de complementação, se necessário, uma certidão do dono do escritório. Mas tudo isso são escoras. A exigência é de elaboração das 5 petições em 5 casos diferentes. Qualquer petição mais substancial (inicial, recursos, contestação, participação em audiência como advogado de uma das partes, sustentação oral em tribunal com seu nome constando no acórdão) pode ser contada. Não precisa ser apenas a inicial e pode ser jurisdição contenciosa ou voluntária. Só não vale petição de juntada, desarquivamento, substabelecimento e essas bobeiras. Também não adianta só ter o nome no substabelecimento. É preciso subscrever a petição. Desde que você assine, é irrelevante quantos advogados assinaram a petição com você. 

Como, em regra, no nosso sistema jurídico, os processos não duram apenas um ano, é possível dar uma manipulada nisso. Por exemplo, se um processo começou em 2010, mas você praticou um ato em 2012, pode contá-lo em 2012 e não em 2010, se isso for melhor para você. O importante é que, ao final, você tenha 5 atos em 5 casos diferentes em cada ano. Seria possível, em tese, contar atos diferentes, praticados no mesmo processo, mas em anos diferentes, já que a Resolução não exige que os processos de um ano sejam diferentes dos do outro. Mas aí já é um risco a mais.

É irrelevante, para fins de contagem do tempo, a prática de mais de 5 atos por ano. Isso não muda nada a contagem. Praticar 15 atos em um ano não transforma um ano em três anos. Contudo, se você tiver atuado em mais de 5 casos, apresente tudo o que fez ou uma parte considerável. Acho importante, para quem de fato advoga, mostrar que exerce a atividade e não apenas cumpre a exigência.

Outra questão: se você colou grau em janeiro de 2011, fez 5 petições em 2011, 5 em 2012 e 5 em 2013, seus três anos só se completarão em janeiro de 2014, no aniversário de sua colação de grau (terceira premissa). Não é possível fazer as cinco petições de 2013 em janeiro e pretender contar o ano de 2013 inteiro antecipadamente.

Modo de contagem do prazo: ninguém sabe muito bem. A princípio, o STF disse, em obter dictum, que era preciso se atentar para o “peculiar exercício forense”, sem nunca ter especificado muito bem o que é isso. Também há decisão no sentido de que o candidato não pode ser prejudicado pela demora na expedição da carteira da OAB. O problema é que essas decisões são muito casuísticas no STF e é difícil estendê-las para outros casos. Essa questão do peculiar exercício forense, por exemplo, já foi negada a várias pessoas que procuraram invocá-la. 

O MPF, no regulamento do 27º Concurso para Procurador da República, art. 45, trouxe uma disposição destinada a regular o modo de contagem desse prazo, da seguinte forma: 

§ 10 – O exercício da advocacia, como atividade jurídica, terá como termo inicial a data constante no protocolo judicial ou a data do documento, quando se tratar de ato extrajudicial, podendo, em relação ao primeiro e ao último ano do exercício da advocacia, o período ser contado proporcionalmente (peça/mês), tendo em vista que a contagem se dará dentro do ano civil”. 

O que o MPF quer dizer é que, se sua primeira petição é de abril de 2010, você computa apenas 9 meses de atividade em 2010. Se a última petição é de junho de 2013, computa apenas 6 meses em 2013. Pessoalmente, eu acho isso certo, pois equipara a contagem da advocacia à de quem é servidor público, que também só vai começar a contar da data da posse (quem toma posse em agosto só conta efetivo exercício a partir de agosto). Mas tenho certeza de que isso vai dar polêmica, caso algum aprovado caia nessa situação. De todo modo, é uma orientação para quem ainda está começando. Procure assinar sua primeira petição assim que possível. Não confie em contar desde a data em que a carteira da OAB foi expedida.

Exemplo: Ainda que não se use a contagem do MPF, o certo é que, para contar três anos de advocacia em 1º de junho de 2013, você precisa: 1) ter colado grau até 30 de maio de 2010; 2) ter praticado 5 atos em 2010, com os quais você garantirá o período de junho de 2010 até o final do ano; 3) 5 atos em 2011, para garantir o ano de 2011; 4) 5 em 2012, para computar o ano de 2012; 5) até aí, você só tem 2 anos e meio de atividade jurídica. Então, também precisará de  5 atos em 2013, para computar também o ano de 2013. Não existe fracionamento de número de petições para ano parcialmente exercido (por exemplo, fazer apenas 1 petição para contar 1 mês). 

Acho muito perigoso tentar fazer o que uma leitora perguntou: começar a atuar em junho de 2011, fazer duas petições, depois fazer mais 3 no primeiro semestre de 2012 e contar um ano de junho de 2011 a junho de 2012. O mais provável é que isso não seja aceito. Se você não fizer cinco petições em um ano, perdeu o ano. Aquele período não servirá para nada.  

Ano parcial: não há problema em contar uma parte de um ano. Exemplo: alguém fez as cinco petições e 2010, mas cancelou a OAB em 1º de outubro por ter passado em concurso incompatível, esses 9 meses de atividade jurídica serão contados. 

Modo de comprovação: é preciso juntar cópia das petições assinadas e protocolizadas. Não confie em juntar apenas procuração ou certidão da vara ou qualquer outro documento. Alguns editais aceitam a certidão da vara, mas ela deve fazer menção específica ao ato praticado e, dependendo da vara, vai dar algum trabalho conseguir isso.

Só por desencargo: é óbvio que, para assinar a petição, você tem que ter procuração ou substabelecimento para atuar em nome daquela pessoa. Nem pense em apenas colocar seu nome lá, junto com o advogado da parte, sem ser advogado constituído nos autos. Também não custa lembrar que outra pessoa assinar para você é crime e você pode vir a ter problemas sérios com isso. Eu já vi juiz oficiar ao Ministério Público (no caso, para mim) para apurar a diferença gritante entre as assinaturas do mesmo advogado no processo. Então, cuidado. Processo judicial não é lista de chamada da faculdade. 

Comprovação de atos no processo eletrônico: o processo eletrônico traz algumas complicações a mais para a comprovação de atividade jurídica, considerando que as petições não são assinadas, nem protocolizadas da forma tradicional. Pior ainda, como cada tribunal tem o seu sistema, é difícil estabelecer uma regra geral para comprovação desses atos. Eu sugeriria fazer o seguinte: coloque o seu nome e a sua qualificação como advogado na petição, mesmo que ela vá ser efetivamente enviada com a assinatura digital de outro advogado que assina junto com você. É óbvio que como o processo é eletrônico, você não precisa assinar a petição fisicamente e escanear a sua assinatura. Basta que seu nome esteja digitado na petição. Assegure-se de que você está cadastrado no processo, de modo a aparecer o seu nome na página em que são exibidos os nomes das partes e dos advogados. Guarde uma cópia da petição e essa tela impressa. Esse é o mínimo que você pode fazer. Como o processo eletrônico é novo, o mais provável é que os tribunais tenham bom senso para avaliar essa comprovação. Se você tiver oportunidade e quiser reduzir os riscos, procure enviar pelo menos 5 petições por ano utilizando a sua própria senha ou assinatura digital. Há alguns tribunais, como o TRF 3, que enviam um e-mail comunicando a aceitação da petição. Se esse for o caso do tribunal no qual você atua, é interessante guardar esse e-mail.

Finalmente, se você ainda estiver inseguro, é sempre possível pedir uma certidão na secretaria da vara de que seu nome consta como advogado no processo e na petição respectiva. Mas, no país da burocracia, a facilidade para conseguir esse documento também vai variar muito.

Advocacia extrajudicial: não há problemas com a atividade de advogado no âmbito extrajudicial. Emitir pareceres, visar contratos sociais, estatutos de associações, divórcios e separações em cartório, tudo isso é atividade jurídica. O mesmo vale para a consultoria em empresa privada. Junte cópia dos atos praticados, devidamente assinados. Se você não assina atos privativos de advogado nessa atividade, a comprovação fica um pouco mais complicada. O ideal seria que sua carteira de trabalho fosse assinada como advogado ou, em caso de prestação de serviços, que houvesse contrato nesse sentido.  

Pós-graduação: A resolução 75/09 do CNJ, reitero, revogou a resolução 11/06, de modo que não há que se falar em recorrer a esta para sustentar um conceito mais amplo de atividade jurídica. Logo, aqui temos uma cisão: o MP aceita atividades de pós-graduação como efetivo exercício e a magistratura não. Nem mesmo o mestrado e doutorado! Para o MP, um ano para pós lato sensu, dois para mestrado e três para doutorado. O recente edital do 27º concurso do MPF, por exemplo, aceita as atividades de pós-graduação normalmente. Se a pós exigir monografia, ela deve ser entregue para poder contar. 

Na magistratura, por outro lado, apenas os cursos de pós-graduação iniciados antes de 12 de maio de 2009 podem ser computados como efetivo exercício, em virtude de uma regra de transição que consta do art. 90 da Resolução 75/09 do CNJ.

Para os concursos que aceitam pós-graduação, não vejo óbice em fazer três pós lato sensu, em três anos consecutivos. Só acho que pega um pouco mal, para quem quer ser membro do MP, cumprir o requisito com três diplomas de pós do LFG ou do Damásio. Espere ser apertado na prova oral. Observe também que, se a pós foi iniciada antes da colação de grau, o período anterior à colação não conta.   

Cargo público privativo de bacharel em direito: conta a partir da data da posse. Não há como contar os meses do ano anteriores no mesmo ano. Quem toma posse em novembro, só terá 2 meses naquele ano.

Cargo público não privativo de bacharel em direito: Diz o CNJ: 

A comprovação do tempo de atividade jurídica relativamente a cargos, empregos ou funções não privativos de bacharel em Direito será realizada mediante certidão circunstanciada, expedida pelo órgão competente, indicando as respectivas atribuições e a prática reiterada de atos que exijam a utilização preponderante de conhecimento jurídico, cabendo à Comissão de Concurso, em decisão fundamentada, analisar a validade do documento”. 

Faça a certidão desse jeito, do modo mais minudente possível. Se fizer assim, descrevendo direitinho, acho que não tem problema. Há muitas pessoas perdendo o sono por confiar nessa certidão, mas acho que podem ficar tranquilos. Dificilmente a comissão vai questionar a certidão. Me parece que ela pode ser expedida pelo superior imediato. Não há necessidade de certidão do dirigente máximo do órgão ou do setor de RH. É o seu chefe imediato que pode certificar o que você efetivamente faz.

Não há um modelo dessa certidão, uma vez que ela depende da atividade que cada um exerce. O importante é que ela seja minuciosa e explique exatamente qual é a atividade desempenhada. 

Cargos cuja advocacia é vedada: esse para mim é o maior problema. A pessoa exerce um cargo público que não é privativo de bacharel em direito, que não tem atividade jurídica preponderante, mas que é proibido de advogar. A única solução segura que vejo é a de exercer a função de conciliador judicial, de modo cumulativo com a profissão. Se não for assim, infelizmente, o remédio será prestar concurso para um cargo intermediário, que não exija a comprovação de atividade jurídica, para depois tentar galgar a Magistratura e o MP. Há, é claro, exceções. Segundo me disseram alguns alunos, o TJSP aceita a atividade policial como de efetivo exercício e, para os advogados, conta só o tempo de OAB, nem exigindo petições. Mas isso é uma peculiaridade que pode mudar ao sabor das mudanças de banca. O melhor, para diminuir o risco, é não contar com isso. 

Atividade militar ou policial: acho que quem é militar ou policial, em exercício na atividade fim, pode ter problemas em utilizar essa atividade como atividade jurídica, salvo em algum concurso menos exigente. O ideal seria exercer a atividade de conciliador judicial cumulativamente (v. abaixo) ou atuar na área-meio, como em assessorias jurídicas, corregedoria, escolas de formação ou outras atividades processuais mais diretamente relacionadas com o conhecimento jurídico. Para quem é oficial, entretanto, pode haver uma outra solução: alguns estados têm exigido curso de Direito para o ingresso nessa carreira e, seguindo o raciocínio relativo ao cargo de oficial de justiça (v. abaixo), me pareceria possível argumentar que o oficialato exigiria conhecimento jurídico em qualquer circunstância. 

Atividade fiscal: essa é, talvez, a situação mais polêmica. O exercício de atividade fiscal (Receita Federal, Receita Estadual, Fiscal do Trabalho, Fiscal de Posturas, Fiscal Ambiental etc.)  exige conhecimentos jurídicos, mas a carreira não é privativa de bacharel em direito, o que denota que a atividade não é preponderantemente jurídica. É um caso análogo ao dos policiais. Assim, se o candidato não desempenhar uma atividade que demande mais precipuamente o conhecimento jurídico, como o julgamento de recursos etc, acredito que possa haver problemas em computar a atividade fiscal como atividade jurídica. Apesar disso, o horizonte não é ruim. O CNJ, no julgamento do pedido de providências 1438 entendeu que a atividade fiscal é atividade jurídica para fins de concurso da Magistratura (http://www.cnj.jus.br/atos-administrativos/3939:atividade-de-auditor-fiscal-vale-como-tempo-de-atividade-jurca. O CNMP, também decidindo casos concretos (Processo n° 0.00.000.000333/2010-19 e Processo nº 0.00.000.000334/2010-63) entendeu que a atividade de Fiscal Federal e Auditor do Tribunal de Contas são preponderantemente jurídicas. Só é preciso observar que esses entendimentos decorrem de decisões em casos concretos, mas  mesmo que possa haver problemas no âmbito administrativo, acredito que, hoje, os fiscais têm bons precedentes para levar aos Conselhos Nacionais ou ao Judiciário. 

Oficial de justiça: em alguns estados da Federação, o cargo de oficial de justiça é privativo de bacharel em direito. Em outros, não é. Há precedente do STF no sentido de que, por isonomia, o cargo de oficial de justiça deve ser considerado como efetivo exercício de atividade jurídica, mesmo que a lei daquele estado específico não exija tal requisito. 

Conciliador judicial: é a possibilidade mais tranquila e menos questionável para quem tem óbices ao exercício de alguma outra atividade, como é o caso de quem ocupa cargos não privativos de bacharel. O CNJ a caracteriza como “o exercício da função de conciliador junto a tribunais judiciais, juizados especiais, varas especiais, anexos de juizados especiais ou de varas judiciais, no mínimo por 16 (dezesseis) horas mensais e durante 1 (um) ano”. A única dúvida que existe é o significado desse “durante um ano”. Poderia ele servir para vedar o cômputo de período inferior a um ano, como alguns meses, ou superior a um ano, como cumprir os três anos sendo conciliador? Me parece que a resposta é negativa a ambas as perguntas. A locução “durante um ano” me parece apenas esclarecer que, para contar um ano, é preciso exercer o ano todo, não bastando, por exemplo, alguns meses por ano. Mas se a pessoa exerce alguns meses e deseja contar aqueles meses que exerceu, não vejo problema. Do mesmo modo, não acho que essa locução tenha o condão de obstar que a pessoa seja conciliadora por mais de um ano. Reconheço, entretanto, que a redação é mesmo ambígua.

UPDATE
Fui informado por um leitor que o Ministério Público Federal não aceitou o cômputo de menos de um ano na função de conciliador como efetivo exercício de atividade jurídica. Seria necessário ter pelo menos um ano completo. 

A vantagem é que não conheço estatuto de nenhuma categoria de servidores, mesmo militares, que proíba a atuação como conciliador, uma vez que se trata de atividade voluntária, que não exige inscrição na OAB.

Também recebi uma questão de uma pessoa que mora em uma cidade muito pequena e o número de conciliações não chega a 16 horas mensais. Eu acho que, nesse caso, o ideal seria pedir ao juiz para ficar à disposição por 16 horas, independentemente do número de conciliações efetivamente realizadas. Acredito que isso resolveria o problema, se o juiz concordar, é claro. 

Magistério: não há problema com o cômputo do magistério superior, desde que a disciplina ministrada seja jurídica. O magistério conta da mesma forma como se conta o cargo público, dia por dia, da data em que foi admitido até a data em que foi demitido. Lembro, mais uma vez, que mesmo que o magistério seja exercido concomitantemente com outra atividade jurídica, não é possível “dobrar o tempo” para fins de contagem. Será necessário aguardar os 3 anos.

Escrevente de cartório público ou privado: vale a regra do cargo não privativo. Se o chefe fizer a certidão descrevendo atividades desempenhadas pela pessoa que exijam conhecimento jurídico, a atividade poderá ser computada. 

“Colaborador” da defensoria pública, “Estágio prorrogado” do MPSP, “estágio de pós-graduação” do TJPR: vários órgãos públicos acharam jeitinhos para contratar pessoas formadas, na condição de estagiários ou de colaboradores voluntários, de modo a reforçar seus quadros. Embora me pareça que tudo isso seja de duvidosa legalidade, sob o prisma do direito administrativo, para fins de concurso público, se você tiver a certidão, dizendo que exerceu atividade junto a esse órgão, depois de formado e que a atividade envolve conhecimentos preponderantemente jurídicos, descrevendo quais são essas atividades, acho que não haverá problemas de comprovação. 

Atividade de orientação jurídica voluntária: essa foi uma das perguntas mais inusitadas que recebi: pessoa que presta orientação jurídica voluntária via internet. É uma questão duvidosa. Rigorosamente, é atividade jurídica, mas temo que, com o conservadorismo das bancas, haja grande possibilidade de que a pessoa tenha problemas. O mesmo vale para atividade de tutor em curso jurídico, já que ambas são situações em que o vínculo entre quem presta o serviço e a instituição (curso ou site) é precário. O ideal seria se garantir com as cinco petições e apresentar isso como reforço. 

Data para a comprovação dos três anos: até 27 de junho de 2012, tanto para a Magistratura quanto para o MP, a resposta era, no ato da inscrição definitiva, que se dá após a segunda etapa do concurso, antes da prova oral. Entretanto, em 27 de junho de 2012 a Resolução do CNMP foi alterada e, para o MP, passou-se a determinar que a verificação se dê apenas no ato da posse. Assim, é possível aos candidatos prestar o concurso para o MP desde a colação de grau. Caso o resultado final saia antes dos três anos, seria possível pedir o adiamento da posse, pelo prazo de validade do concurso, de modo a aguardar a complementação do tempo. Atenção apenas para o prazo de validade que, eventualmente, pode ser pequeno nesse tipo de certame. Só gostaria de observar que a jurisprudência era consolidada no sentido de que requisitos do cargo só se exigiam na data da posse. Quando MP e Magistratura passaram a exigi-los na inscrição definitiva, o STF se manifestou dizendo que MP e Magistratura são cargos especiais, que exigiriam maior segurança jurídica e, portanto, validando a exigência antes da posse. Agora o CNMP voltou atrás e o STF ainda não se manifestou. Resta saber se exigir esse requisito antes da posse é uma prerrogativa ou um dever do MP e dos tribunais. 

Em síntese, meus amigos, creio que, com uma leitura criteriosa, é possível enquadrar nas hipóteses que abordo aqui todas as situações de atividade jurídica para a Magistratura e o MP. Sei que algumas defensorias e advocacias públicas também têm passado a exigir esse requisito. Nesse caso, será preciso verificar cada edital, já que não há órgãos nacionais de uniformização de entendimentos. Aqui o céu das confusões é o limite. Há quem aceite atividade antes da colação de grau e tudo mais. Nosso guia, para essas hipóteses, deve ser usado com moderação. 

Agradeço muito a todas as pessoas que mandaram suas dúvidas sobre o assunto e me permitiram escrever uma postagem tão rica. Espero que, no futuro, todos possam dizer aos colegas “dúvidas sobre atividade jurídica? Lei a bíblia!”