quinta-feira, 8 de março de 2018

A PRESENÇA Mulher nos Concursos Públicos

Como já é tradicional neste blog, hoje temos um texto especial para o dia internacional da mulher. Convidei a minha amiga Ana Lúcia Spina, que divide comigo os curso de preparação para a prova oral e é, como já mencionei em outra ocasião, uma das maiores autoridades em comunicação no Brasil.

A PRESENÇA Mulher nos Concursos Públicos

Era uma manhã fria e azul de inverno, eu aguardava em meu consultório a chegada de uma candidata que estava aprovada para fase oral da magistratura. Já havíamos nos falado por telefone (ainda não se usava WhatsApp, parece que não existiu essa época) e ela me parecia bastante ansiosa e preocupada. Viria de longe, de outro canto do Brasil, para conversarmos sobre desempenho da comunicação na fase oral. 

A candidata chegou, era uma jovem muito expressiva na comunicação. Determinada, como é o caso de todos que chegam à essa fase, acreditava que seu saber não era suficiente, dizia que todos perceberiam que ela não merecia estar ali e que ela nem dormia mais pensando nas catástrofes que poderiam acontecer durante a prova oral. Eu não conseguia observar a alegria e o contentamento por ter chegado ali, na tão esperada terceira e última fase que a tornaria juíza se fosse aprovada. A angústia e o medo falavam mais alto do que a alegria pela conquista. 

Essa é uma história recorrente para a maioria dos candidatos aprovados para a fase oral. Homens e mulheres se angustiam ao pensar que passarão por uma avaliação “olho no olho”. Hoje, em razão do nosso dia, vamos direcionar o olhar e a atenção para a mulher, para as características femininas na fase oral do concurso público. 

Vamos então voltar para nossa candidata. Eu perguntei se ela conseguia ter uma descrição verbal do medo que sentia, pois habitualmente o medo imaginário é o que nos aflige e para o medo real podemos traçar estratégias. 

A resposta foi enfática: preciso transmitir firmeza, preciso parecer confiante, preciso estar segura, não sei me impor e não quero mostrar que tenho medo, por fim, tenho medo de parecer frágil e muito feminina e que isso me prejudique.

Eu olhava para a candidata e tinha uma certeza, a sua percepção interna da realidade estava muito pior do que a verdade da realidade externa. Eu via ali uma jovem determinada, forte, expressiva, que se comunicava bem e que precisava apenas de alguns direcionamentos para aproveitar ao máximo suas características. Eu não via nela o que ela acreditava que transmitia. Tudo bem, não estávamos na fase oral e naquele momento ela estava se sentindo mais segura em relatar tudo aquilo, mas todas aquelas características comunicativas eram propriedade dela e poderiam estar com ela em qualquer momento da existência, precisava do comando interno, da autorização interna para se tornar constante. E porque essa angústia acontece? Por que nós nos avaliamos à luz das nossas emoções, enquanto o outro nos avalia à luz das nossas ações. Acessamos poucas vezes esse olhar que o outro tem de nós. Temos um ponto cego na comunicação que somos nós mesmos.

Perguntei para a jovem candidata se alguém havia dito que ela não possuía essas características. Ela disse que sempre havia pensado assim e que algumas pessoas haviam reforçado dizendo que ela deveria estar “empoderada” no momento da arguição. 

Imagine você, uma pessoa pensar que não é nada disso e que precisa “parecer ser” tudo isso. Precisa “enganar” uma banca de examinadores porque se ela for quem realmente é não será aprovada. Como alguém pode conviver bem com essa imagem? 

Então eu digo para vocês!!!! Vocês não só podem, como têm que ser quem são. Se eu não posso ser quem sou, naturalmente isso já traduz uma negação e uma insegurança na expressão de comunicação. 

É isso, ter coragem para ser quem se é. Mas, logicamente com uma percepção ampliada de quem se é. É essa nossa intenção. Ampliar a percepção de quem se é, ajustar características que possam interferir na boa comunicação, identificar dificuldades e sugerir treinos. Toda dificuldade indica falta de treino. O candidato por si só está destreinado com a comunicação em público. Habitualmente ele fica confinado aos estudos e não utiliza da fala. Os estudos solicitam uma desenvoltura no cérebro associada à memória, enquanto falar requer outros treinos e associações cerebrais.

Muitas vezes temos a ilusão de que nossas características pessoais não têm valor e há pessoas, na intenção de orientar, que acabam reforçando isso. 

Então, candidata que lê esse texto, o que é necessário para sua fase oral?

Primeiro, perceba-se, não tenha medo de se olhar de fora. Procure um olhar técnico ou de um amigo que te dê indícios do que você expressa quando se comunica. Na comunicação saiba que, olhar nos olhos é algo extremamente importante em nossa cultura pois traduz confiança. Não se negue, se conheça e ajuste, por meio de treino, suas expressões, postura e gestos. Busque as suas características, nada mais forte e seguro na comunicação do que isso. A diversidade é a base da criatividade e é o que faz as pessoas serem interessantes. Saiba que o medo faz parte do momento, até porque a ausência do medo seria estranha, pois é um momento que define sua vida. Coragem é fazer apesar do medo e não na ausência do medo.

E por fim o nosso motivo mais importante aqui hoje, o cuidado para não confundir diferenças com inferioridades. Somos diferentes na voz e traços femininos não são indicativos de fraqueza. Fraqueza é se negar, seja para o homem ou para a mulher. É trocar aquilo que somos por aquilo que acreditamos que o outro quer ver em nós. 

Nesse caso especificamente, o que a banca examinadora quer ver é alguém que não abre mão de estar ali mesmo nesse momento de tensão, que não tem nada a impor, nada a esconder, mas muito a servir pois só pode servir quem tem conteúdo para isso. Isso traduz coerência e humildade.

Modelos de imposição podem traduzir arrogância, traço esse que causa distanciamento nas relações comunicativas e em qualquer relação humana.

Então mulher, seja elegante. Elegância no tratamento, na postura, no olhar, até quando não sabe o que responder, seja elegante. Seja elegante na roupa discreta e que combine com você. Elegância é manter os traços de presença ainda que em situações desconfortáveis e desafiadoras. Elegância feminina é um traço que denota presença e força. Este, penso eu, é o verdadeiro poder, perceber o outro, acolher o momento e não perder a conexão e nem a elegância. 

Que as mulheres estejam cada vez mais ocupando esses espaços profissionais expressivos e com isso levem feminilidade para que a sociedade experimente o valor da soma das diferenças. 

Quanto à nossa candidata? Foi aprovada e muito bem aprovada!

O que ela fez para isso? Se observou, se percebeu, se ajustou, treinou para aprimorar e assim se sentiu segura por estar na fase oral sem ter que se impor mas sendo fiel às suas características e estando presente no momento com autodomínio e ainda, com elegância. Isso é maturidade comunicativa para qualquer gênero. 

Ana Lúcia Spina





 Fonoaudióloga – Especialista em Voz – Mestre e Doutora pela UNICAMP – Coach pela Sociedade Brasileira de Coaching – Autora do livro Como Falar bem em Público, Editora Impetus, 4ª Edição – Ampla experiência em Comunicação Corporativa com treinamento em grupo e individual.

Professora de Comunicação no Curso Ductor- Preparação para comunicação de fase oral.