quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

O valor da experiência

Meu amigo Rogério Neiva publicou outro dia uma postagem muito interessante sobre um tema que já abordei aqui: a questão de apenas estudar ou trabalhar e estudar. O texto (que está aqui) é o seguinte:

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"Vale a pena ser ficar por conta dos estudos voltados à preparação para o concurso público? Vale a pena pedir demissão para se dedicar exclusivamente aos estudos? Vale a pena ser concurseiro profissional? É racional e eficiente a presente atitude? A busca de uma resposta adequada pressupõe a avaliação de um conjunto de variáveis e fatores. E o objetivo do presente texto consiste exatamente na provocação à reflexão e fornecimento de subsídios sobre o tema.

Uma primeira noção importante consiste na compreensão de que o tempo corresponde a um dos principais recursos no processo de preparação para o concurso público. Apesar da falta de tempo não impedir a aprovação, tal recurso tende a impactar na tendência de prazo para que o candidato conquiste o objetivo almejado.

Mas é fato que se o candidato fica exclusivamente por conta dos estudos, teoricamente, estará ampliando o relevante recurso correspondente ao tempo.

No entanto, por outro lado, o candidato que se dedica exclusivamente aos estudos assume um elevado custo de natureza emocional. Ou seja, tende a se sentir pressionado pelo resultado, em condição que não estaria caso não tivesse optado por este caminho.

Naturalmente que este custo emocional varia em função de fatores subjetivos e objetivos.

No plano subjetivo, nem todo mundo percebe e trabalha com adversidades e cobranças da mesma forma. Existem aqueles que contam com uma sensibilidade maior, tendo capacidade mais limitada para conviver com tal cenário adverso e trabalhar soluções. Já outros contam com comportamento contrário, isto é, têm sensibilidade mais contida e menor dificuldade de convivência com adversidades.

No plano objetivo, as diferenças de circunstâncias também determinam distintas avaliações. Por exemplo, um candidato que pede demissão para sobreviver com reservas financeiras limitadas, que contam com prazo de validade, vivenciam um contexto diferente daqueles que dispõe de uma estrutura financeira sem prazo de validade fixado, como no caso do candidato que conta com os pais ou o cônjuge para garantir a sua sobrevivência.

Nesta equação ainda há outra variável a ser considerada, talvez de natureza secundária, ao menos do ponto de vista cognitivo e dos estudos, porém de caráter relevante, que consiste no custo financeiro e custo de oportunidade. O custo financeiro envolve o quanto se gasta materialmente para sobreviver e atravessar esta trajetória. Já o curso de oportunidade corresponde ao que se deixa de ganhar.

Mas o aspecto fundamental é que o candidato deve avaliar os custos e os benefícios de cada opção, pois cada uma conta com seus ônus e bônus. Para aqueles que contam com a opção de seguir um caminho ou outro e estão em dúvida, talvez a matriz abaixo ajude a sistematizar a compreensão do cenário e facilitar a tomada de decisão, inclusive com a atribuição de parâmetros quantitativos ou notas (por exemplo de -10 a +10) em cada célula:



Porém, como tudo na vida é dialético, também é possível encontrar caminhos alternativos. Ou seja, buscar uma ocupação que proporcione uma renda menor, mas garantindo um tempo maior.

Também é possível trabalhar estratégias que envolvam gradações de objetivos e avanços nas condições de estudo conforme as conquistas alcançadas. Por exemplo, o candidato estabelece um objetivo que viabilidade maior e custo de alcance mais limitado. Conquistando, pede demissão do emprego, de modo a ficar por conta dos estudos até ser empossado.

Durante o meu processo de preparação para o concurso que havia eleito como objetivo principal (para o cargo de Juiz do Trabalho), houve um período em que havia pedido exoneração de cargo que ocupava, já estando aprovado no concurso de Advogado da União, para ampliar o tempo de estudo. Porém, de modo a garantir minha sobrevivência, trabalhava como professor na graduação do curso de Direito, apenas no período noturno, de segunda a sexta-feira. Com isto, tinha as manhãs e tardes durante a semana e os finais de semana livres para estudar, o que me rendia quase 50 horas de estudos semanais.

Outra compreensão importante nesta reflexão consiste na diferença entre o conceito de tempo e duração. Enquanto o tempo tem relação com a disponibilidade de horas que o candidato pode investir nos estudos ao longo de micro-unidades de duração, tais como a semana, a duração tem relação com o início do processo de preparação para o concurso público e o seu término, tendo como marco final a aprovação.

Dentre os conceitos metodológicos que fundamentam o Sistema Tuctor, trabalha-se com a idéia de mircounidades de duração, o que corresponde ao conceito de “microciclo de estudos”. Inclusive, tal construção se baseia na noção de fragmentação do plano de estudos, o que tem bases nas ciências da gestão, bem como na andragogia, campo do conhecimento voltado ao estudo da educação de adultos.

E desta premissa decorre outro conceito importante, aplicável à presente reflexão, o qual corresponde à teoria da tripla restrição. Segundo esta, todo projeto se sujeito a três restrições, as quais correspondem à qualidade, tempo e custo. Aplicando a presente idéia à preparação para concursos públicos, o tempo conta com o sentido de duração, sendo delimitado pelo início e fim da preparação, sendo que o custo se relaciona com o tempo, envolvendo a capacidade de investimento do candidato, em termos de horas de estudos por cada unidade de duração.

Na prática, isto significa que a diferença entre um candidato que tem mais tempo para aquele que tem menos consiste exatamente na duração, ou seja, quando terminará o processo de preparação, por meio da aprovação, tendo como parâmetro o início dos estudos.
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O texto, como se percebe muito bem escrito, me parece tender para o entendimento (não expresso), de que se dedicar integralmente ao estudo é melhor. Pode não ser essa a intenção do autor, mas é o que me pareceu (o texto publicado deixa de pertencer ao autor, então...). Como já disse aqui no blog, minha opinião é distinta. Acho que é melhor trabalhar, de preferência em um trabalho criativo e de meio período, e gostaria de declinar, talvez de modo mais explícito, os motivos:

1) É claro que um trabalho de horário integral atrapalha, mas um trabalho de meio expediente ainda lhe deixará, em regra, a manhã e a noite livres.
 
2) Quem só estuda precisa de muito foco, para não se perder em atividades alheias ao estudo, como atividades domésticas, familiares etc. A tendência ao "já que você está aqui, faça isso", é muito grande. Em geral, quem trabalha sabe que o tempo é reduzido, e acaba focando melhor nesses momentos.

3) A capacidade de processamento do cérebro é limitada. Mesmo que você possa ler 500 páginas em um dia, será difícil absorver tudo isso de uma vez. Me parece melhor que as informações venham de modo mais gradual.
 
4) Quem trabalha não tem que dizer que está "só" estudando para concurso, o que é, bem sei, uma pressão social muito grande.
 
5) O trabalho, especialmente se for criativo (atividades como assessor, ou em procuradorias etc) é um grande método de fixação, talvez o melhor. Você nunca se lembrará de algo que leu em um livro tão bem quanto aquilo que teve que resolver no trabalho.
 
6) Estatisticamente, a maior parte, acho que poderia dizer, a imensa maioria dos aprovados para os concursos da magistratura e MP já ocupava outros cargos públicos. O número de "concurseiros", pelo menos nesse nível de cargos, é significativamente menor que o número de pessoas que já trabalhavam. Como esses são os concursos mais difícies, esse dado parece indicar que o trabalho não é, efetivamente, um óbice para que alguém possa ser aprovado.

O que eu concluiria disso? Use o trabalho a seu favor. Se ele é um tempo furtado ao estudo, procure se interessar por aquilo que faz, de modo a transformá-lo em um estudo. Mesmo que você seja um servidor de secretaria, procure ler os processos, entender o que está acontecendo e não apenas fazer aquilo que lhe cabe. Tenha certeza de que isso será representativo. E, é claro, procure se colocar, tão rapidamente quanto possível, em um trabalho que lhe permita aprender.

Um grande problema da geração dos concursos é que a pessoa já entra na faculdade achando que a decoreba e os livros (principalmente as sinopeses) resolvem isso. Faz estágio o mínimo possível e depois não quer cumprir sequer os três anos de efetivo exercício. Isso me parece um grande erro, que tem contribuído para dificultar as aprovações.

4 comentários:

  1. Dr. Edison, em uma coisa eu não concordo. vc diz que as pessoas que passaram em concursos mais difíceis já trabalharam, e induz a conclusão de que isso é um indício de que o trabalho ajuda na preparação.

    por outro lado, eu retiro outra conclusão disso, creio que essas pessoas que trabalham passam pq já estudavam há mais tempo, tanto que já passaram em outros concursos (e por isso trabalham).

    Dr. Edilson, parabens de blog e muito obrigada por ele.

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  2. Prof. Edílson V.,

    Como saber quais faculdades cursaram os aprovados ? obrigado

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  3. Incrível a sua conclusão professor... Passei recentemente por isso, e posso afirmar, segundo a minha experiência, que estar totalmente disponível para o estudos pode causar um sensação de marasmo e indolência, pois afinal de contas temos todo o tempo do mundo, em suma, a produtividade e o foco é em muito prejudicado... Iniciei um trabalho como assessor parlamentar na Câmara dos Deputados, e trabalho com projetos de lei, análises de constitucionalidade etc, e isto tem contribuído para minha sede de conhecimento, e principalmente para a fixação dos temas enfrentados no trabalho... Ainda estou reorganizando meu tempo de estudo, mas tenho a certeza que ele será bem mais focado e objetivado. obrigado professor. Feliz natal..

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  4. Oi, Professor. Eu fico realmente em dúvida nesse assunto. Sou assessora e às vezes saio do trabalho 19h. Chego esgotada e, principalmente no fim do mês, acabo levando trabalho pra casa. Preciso do dinheiro pois não tenho quem me sustente. Ao mesmo tempo, estou poupando o suficiente para ficar pelo menos um ano sozinha, estudando em casa. Só tenho medo de demorar tanto a passar que me arrependa de ter saído...

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