terça-feira, 20 de agosto de 2013

27º Concurso do MPF: primeira impressões

Enfim, a primeira etapa passou e o gabarito saiu. Já escrevi anteriormente sobre como lidar com esse momento (ver o post como aproveitar bem uma reprovação). Para quem fez os mínimos ou está com chances, em razão das anulações, a notícia é boa. Nos três últimos concursos, quem fez os mínimos foi para a segunda etapa. Também tivemos a informação oficial de que houve 27,27% de abstenções na prova (um número bastante alto), sendo que 4.964 candidatos efetivamente fizeram a prova. É claro que, se considerarmos 70 aprovados, média dos concursos anteriores, ainda estamos falando de 71 candidatos por vaga. 

Em relação à prova, várias pessoas escreveram dizendo que acertei em várias previsões. Transcrevo de um leitor: "Simplesmente infalíveis suas dicas para a 1ª fase do MPF. Realmente me ajudaram muito".

Vou começar meus comentários pelo Constitucional. Nessa matéria, penso que, de fato, acertei nas previsões. A prova começou com 3 questões de entendimento do STF e depois partiu para os direitos fundamentais. Vou comentar especificamente a questão 6, relativa aos direitos indígenas: 

6. ASSINALE A ALTERNATIVA INCORRETA:
a) ( ) o Supremo Tribunal Federal já decidiu que a intimação de indígenas para prestar depoimento,na condição de testemunha, fora de suas terras, constrange a sua liberdade de locomoção, por força
de dispositivo constitucional que veda a remoção dos grupos indígenas de suas terras;
b) ( ) a Constituição de 1988 é, a um só tempo, antropocêntrica, antiutilitarista e plural, o que possibilita ao Poder Público, no processo de tomada de decisões, o acolhimento de razões religiosas ou metafísicas;
c) ( ) para o Supremo Tribunal Federal, as políticas de inclusão englobam não só redistribuição de recursos, mas também reconhecimento das diferenças, na perspectiva de uma sociedade plural;
d) ( ) o pluralismo cultural, aos menos no plano normativo interno, demanda a intervenção do Estado no sentido de garantir a sobrevivência de específicas concepções de vida boa.

Não era preciso estudar muito para responder a essa questão por eliminação. É evidente que o poder público não pode tomar decisões baseadas em razões religiosas ou metafísicas. Em relação à assertiva A, relacionada aos índios, o precedente é o seguinte: 


"CPI: intimação de indígena para prestar depoimento na condição de testemunha, fora do seu habitat: violação às normas constitucionais que conferem proteção específica aos povos indígenas (CF, arts. 215, 216 e 231). A convocação de um índio para prestar depoimento em local diverso de suas terras constrange a sua liberdade de locomoção, na medida em que é vedada pela Constituição da República a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo exceções nela previstas (CF/1988, art. 231, § 5º). A tutela constitucional do grupo indígena, que visa a proteger, além da posse e usufruto das terras originariamente dos índios, a respectiva identidade cultural, se estende ao indivíduo que o compõe, quanto à remoção de suas terras, que é sempre ato de opção, de vontade própria, não podendo se apresentar como imposição, salvo hipóteses excepcionais. Ademais, o depoimento do índio, que não incorporou ou compreende as práticas e modos de existência comuns ao ‘homem branco’ pode ocasionar o cometimento pelo silvícola de ato ilícito, passível de comprometimento do seustatus libertatis. Donde a necessidade de adoção de cautelas tendentes a assegurar que não haja agressão aos seus usos, costumes e tradições." (HC 80.240, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 20-6-2001, Segunda Turma, DJ de 14-10-2005.)

A questão 9 também continha uma alternativa sobre direito indígena, que quem leu meu livro não teve dificuldades em considerar verdadeira:  


d) ( ) o tratamento constitucional da atualidade no que se refere à questão indígena tem como seu pressuposto central o pluralismo.



É claro que não é uma prova fácil, como nenhuma prova do MPF é, mas para quem estava se preparando, não foi das piores. Talvez a maior dificuldade tenha sido o excessivo foco na jurisprudência do STF e menos na teoria, como foram as anteriores. E não foi jurisprudência copiada de informativos, mas entendimentos que demandavam um conhecimento mais consolidado das decisões, que permitisse ao candidato extrair conclusões delas, e não apenas decorar seu teor. Um bom exemplo disso me parece estar em uma assertiva da questão 8: "é possível, para a resolução de antinomias entre normas constitucionais, interpretação que conduza à criação de uma terceira norma, que incorpore elementos daquelas que entraram em conflito". Até onde sei, essa conclusão é passível de ser extraída das decisões do STF, mas desconheço decisão em que conste expressamente essa possibilidade analisada. Essa é a diferença entre a prova do MPF e outras provas. Não adianta decorar o resultado do julgamento. Tem que pensar a partir dele.  

2 comentários:

  1. Caro professor,

    Realmente suas dicas foram de extrema relevância na prova.
    Em relação à questão 8, o colunista da Conjur Aldo de Campos, em correção publicada naquele site (link: http://www.conjur.com.br/2013-ago-09/toda-prova-resolucao-prova-27-concurso-mpf-parte), afirmou que aquela assertiva teria sido extraída do livro Direito Constitucional - Teoria, História e Métodos de Trabalho, de Daniel Sarmento e Cláudio Pereira de Souza Neto.
    Aliás, de acordo com aquela postagem, várias questões do grupo I também teriam sido extraídas de trechos da referida obra.
    Não tenho esse livro, até porque está esgotado. O que digo é baseado nas informações prestadas pelo referido colunista.

    Diante disso, será que vale à pena apostar em novas questões extraídas dessa obra para a segunda fase?

    Por fim, indago se 75 questões líquidas (62,5%) justificariam um mergulho total nos estudos para a próxima etapa?

    Atenciosamente,

    Carlos

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  2. A questão da terceira norma, ao menos em matéria penal, foi decidida pelo Pleno do STF no RE596152-SP em sede de repercussão geral, inclusive. Devido ao empate ocorrido na votação, o Tribunal adotou a interpretação mais favorável ao réu, admitindo a possibilidade de utilização de terceira norma mais benéfica. No julgamento, várias normas constitucionais foram citadas, a exemplo do principio da igualdade e do da retroatividade da lei penal mais benéfica.

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